segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

dos últimos meses




desde outubro. as cartas não se silenciaram e mais prisioneiros foram libertados. os pássaros voam e cada vez com menos medo. há contudo uma necessidade urgente de cuidar. cada vez mais. as mais de cem páginas foram escritas; foram mesmo escritas e deixei-me cair sobre alguns (poucos) dias de inércia. dois processos. Uma Odisseia que tanto prazer dá atravessar. o meu corpo está pousado, silencioso, cansado também. um ano, mais um ano, chega ao fim. guardo incríveis paisagens, momentos, sorrisos como grandes tesouros. preparo o próximo que aí vem. sem grande expectativa e já como uma grande aventura para começar. mais uma vez: romperei silêncios. talvez faça nascer outros novos, os da vergonha, do medo. mas que se fale do que ninguém fala. continuo a abraçar-me às causas. continuo a acreditar que é mesmo possível fazer a diferença e que é possível um mundo melhor. que 2014 seja assim: cheio de esperança.


2013: corpo em movimento; um monte em vila velha de ródão; espaço vazio que é cheio; rotas a pé; escrita; saydoun; istambul; gestos; sem rede; homero; tese; melhor prenda de natal de sempre; amor-muito.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

do então



as mãos tremem novamente. a escrita está embrulhada. quero dizer, está guardada, quero dizer, está condicionada. estarei eu. há um documento em aberto. dois. três. registos. essa ideia de memória. e tudo se guarda. fotografias, palavras, papiros, paredes, ruínas. arqueologia. poesia arcaica. cidades-estado. a percepção da história cíclica. o círculo. e vamos lá parar outra vez? e é um espelho o que temos afinal/no final. e eu, Alice, do outro lado. nego este mundo assim como está. nego-o. as cartas prosseguem. a voz não se silencia. afinal pertence-nos a língua, a linguagem, as palavras. tudo se embrulha então. mas neste momento são 100 páginas que me puxam para um final - que se feche. que se feche esse ciclo também. que se abram outros. que as portas sejam janelas e as janelas portas e o medo seja mentira. o medo é uma mentira. e estreia hoje. sem rede. e então é isto. e então o corpo. e então o olhar. e então a plateia. e então escuto e então guardo. a escrita chegará talvez nos próximos dias. e ultrapassará as 100 páginas. e poderá trazer uma primavera por dentro de um inverno. e um corpo-pensante. circundo-as-palavras-que-se-calam.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

dos corpos deitados



regresso para perto do oceano. aqui estou. com o sol a deitar-se em mais um final de dia. e tantos dias passam e tanto o coração aperta. tantos corpos se deitam em tantos finais de dia que ainda são de dia. tanta injustiça que caminha lado-a-lado com tamanha beleza. e que tamanho temos. e que tamanho têm as montanhas viradas para o mediterrâneo. as fronteiras, a ideia de fronteira, altera-se, agiganta-se. a fronteira traz o medo, a insegurança. a fronteira é a guerra. a fronteira não são rios mas sim mapas manchados de sangue. não consigo virar a cara. fico parada alguns momentos no mesmo sítio com os olhos a inundarem-se de lágrimas. são armas. e são pessoas que morreram ou estão a morrer à entrada dos hospitais e são tantas as crianças. e as mães gritam. e ouço gritos de mulheres. e as câmaras tremem e as imagens dificilmente mentem. e agora? e agora que caminho com o coração cheio de sorrisos e disponibilidade e visão. e fecho os olhos e ainda ouço os grilos e ainda cheiro a humidade do mar e ainda ouço as árvores e ainda vejo os sorrisos e ainda ouço as vozes e os cânticos e ainda danço. e o meu coração dança e rodopia e fico tonta e tão tonta com beleza tamanha. mas o meu coração fica parado. e os meus olhos ficam inundados de lágrimas quando as imagens gritam a injustiça, quando as fronteiras são guerra, porque quando o mundo pára-páro com ele. 

(entre líbano/portugal/síria)

quinta-feira, 25 de julho de 2013

da sociedade civil


«Se o poder político é, em Portugal, sensível a todas as pressões, menos às dos cidadãos, não é porque ele seja diferente de outros, no resto da Europa. É porque a nossa sociedade civil é pouco ativa, pouco persistente e pouco exigente. Quando se mexe, quando insiste, quando não espera que a realidade mude apenas com uma manifestação, em Setembro, os resultados acabam por se sentir. Depois da aprovação da nova lei, a realidade dos falsos recibos verdes não mudará de um dia para o outro. Mas melhorará um pouco. Porque estas guerras levam tempo e dão trabalho. Fazem-se de pequenas batalhas. E esta foi ganha.» 
Daniel Oliveira, Antes pelo contrário, no Expresso
 

quinta-feira, 18 de julho de 2013

dos joelhos e dos traumas


os peixes também sangram. um maxilar bem desenhado. rectângulo. joelhos traumatizados. narrar um rasgo laranja-amarelo no horizonte que não se mexe e ser brindada com visões poéticas de pessoas com menos de um década. os políticos iniciam as campanhas que nos jornais são traduzidas para corridas e de repente estamos todos a observar uma maratona. continuo na observação do movimento, dos movimentos. na prática. um monte de roupa enlaçado em dois cestos e a minha vontade em atirar-me lá para cima, gritar um pouco, lançar ao ar. made in china e um desafio para 30 dias. caminhar pelas ruas sentindo a potencialidade dessas ruas sentindo até um pedaço de medo sentindo até um pedaço de calor-frio sentindo até uma vontade de construir. construir reconstruir. continuar. rotando. mas uma tese não se escreve sozinha. há também grades que precisam de derreter. ainda. muitas. e as velas parecem ser cada vez menos. as pessoas caminham em silêncio, olham-se em silêncio, algumas já não se olham. são amigas no facebook mas não se cumprimentam na rua. uma canção. a violência de uma dança. a violência da não-violência. uns joelhos traumatizados. uma viagem a adivinhar-se uma aventura inominável. rectângulo redondo dentro de um mapa. traumas. mercadoria. projectos. desenhos. maxilar. ossos. roupa. corpo. documento. segredo.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

das asas


um abrandamento dos passos ao mesmo tempo que o coração acelera. é um fenómeno, está a perceber? como se tivesse uma parede muito forte, muito resistente, uma película que não poderei chamar pele nem músculo nem membrana. é qualquer coisa inominável. atravessa sem atravessar? não sai do peito saindo. e lá estou eu às voltas de um coração que também rodopia. um abrandamento dos passos enquanto o mundo se amplia. enquanto as asas dos pássaros se abrem ou enquanto um casal de andorinhas se prepara para dormir no fio do terraço daquela casa. e há pássaros que abrem as suas asas mas parece que mais ninguém repara. o calor é tanto que as árvores são invadidas de grilos em histeria durante a luz do dia e discretos vão invadindo depois o silêncio da noite-das casas. electricidade no ar. os passos abrandam ao mesmo tempo que abranda ligeiramente o dia: a luz abre. o sol despede-se a cada dia um pouco mais tarde um pouco mais cedo. e eu atravesso. e vou de mãos dadas. quem disse que o verão não chegava?

domingo, 26 de maio de 2013

da criação-comunicação


queria(?) narrar sobre a vida que tem escorrido das árvores e da morte dos seus membros. da perda de partes. da criação de espaços para criação de vida. da morte como criação de vida. da insistência última em ver por dentro do fora. em virar do avesso sem desfazer. danço com as árvores e embalo-me com o vento brando. uma árvore não está imóvel - as suas raízes nunca deixam de crescer - de se movimentar - de adentrarem ainda mais na terra - de se expandirem por debaixo do sol/solo - abarcando - devolvendo - aconchegando. e vai crescendo - dançando a sua verticalidade. um desafio às leis da gravidade. e nós também. verticais. danço na vertical. o corpo escorrega para cima. entre o céu e a terra e o invisível. uma árvore podada é a perna do m. o seio da e. a trompa da s. é o espaço vazio que fica por dentro do contorno. o desenho não desaparece. é a dor fantasma. porque a vida continua lá. entendamos: a vida é a consequência da vida. e a morte nasce connosco desde que somos célula.

domingo, 19 de maio de 2013

da ruína


residência artística em vila velha de ródão | tapada da tojeira
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da distância que se faz proximidade




o invisível torna-se visível se o quiseres ver.

densificar a pergunta - afinação


a solidão acompanhada aparece então como a vibração de escutar o acontecer entre. entre chegar-deixar chegar, entre célula e matriz, entre uma membrana e outra, mas também entre o desconhecido e o desconhecido. a afinação não é mensurável, pelo menos não com um dispositivo que a fixe. quando duchamp pergunta como fixámos o metro densifica a pergunta das coisas fixas.

solidão acompanhada, por sofia neuparth

sábado, 18 de maio de 2013

dos pássaros


«Nessa fase, estranhamente, os pássaros começam a oferecer-se-nos, atravessam-se-nos ao caminho nos sítios mais inesperados (no meio da cidade, até) e curam eles mesmos a leve angústia que sentimos quando deixou de haver tempo para sair de propósito ao encontro deles. E é o que nos salva.»

Depoimento sobre pássaros, de Gustavo Rubim

terça-feira, 16 de abril de 2013

(ainda) do movimento



em movimento contínuo não sei ainda bem a que velocidade. dentro do corpo. a adentrar no corpo. na escuta. um estado de alerta constante. um cansaço que vai chegando e eu a tentar mandá-lo embora. ainda a espera. tantas vezes a espera. e surgem perguntas: Perguntar! um limbo entre a euforia e a apatia. as ruas a desenharem os mapas das cidades e as árvores com os seus mapas próprios nos troncos e a minha geografia inteira dentro disto tudo. deste mundo inteiro. desta maravilha toda. que tem tanta merda. encontrar novas perguntas a cada dia. onde mora a tua atenção? eu vou passeando a minha pelo agora. talvez por isso fuja aos textos, à academia, à literatura. venha um pouco de filosofia. venha o pensamento-movimento. convocarei as superfícies de encontro.

sábado, 2 de março de 2013

estar

torel, upload feito originalmente por sossego.

a rota levou-me até um jardim maravilhoso - onde se aprender a estar - a respirar. onde há também contrastes mas onde os bancos de jardim são ainda feitos para as pessoas. este sol de lisboa reflectido por toda a cidade - reflectido no rio. este sol de lisboa que é só o de lisboa que não pode ser de mais nenhuma cidade.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

do sentir que é isto que dizes


«E as coisas fluem, devem fluir, quanto mais tempo melhor, e mesmo as palavras que então só dizemos só servem para exprimir aquilo que nós vivemos na relação amorosa, e isso não é necessariamente a essência do amor. Digo, és tão bonita, e exprimo não um juízo estético, mas um estado de alma, quero dizer que não há nada tão bonito como tu e que essa beleza me comove e é dessa comoção que irrompe o amor que sinto por ti. Percebes?»

António Mega Ferreira em A Expressão dos Afectos

do estendal


gosto de ficar a ouvir histórias de vida. estar numa casa ligeiramente inclinada, pequena, onde tudo se agiganta. A começar pela D. Piedade, que enche a pequena sala de ternura de tal forma que extravasa a janela. gosto de estar perto de pessoas como a D. Piedade, para quem um estender de roupa é um acto de coragem.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

«ACCOMPAGNATO
Uma ruga, o chão é uma ruga, se inclinarmos a cabeça encostando a orelha na relva húmida e macia apercebemo-nos dessa quase imperceptível flutuação do horizonte, como se a terra respirasse suavemente, numa contracção regular e repousada, sem sobressaltos nem susto.»

António Mega Ferreira, em A Expressão dos Afectos

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013


descobri hoje ser: «coreógrafa da complexidade»

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013


«(...) a mais íntima de todas as experiências: como os indivíduos estão ligados uns aos outros e, no entanto, isolados por invisíveis tecidos de ritmos e por paredes de tempo ocultas.»

em A Dança da Vida de Edward T. Hall

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013



Pacto com P.: Fazer o pino todos os dias.

sábado, 5 de janeiro de 2013

room 209

da afirmação



Começar começando. Fiando pouco a pouco um novo corpo e um novo estar. Os primeiros dias como inspiração: castelo, barcos, bicicletas, chás, mar, doces. Segurar-me às coisas pequenas para não me atrapalhar com as maiores. Acreditar que as decisões difíceis não pesam e que tudo é relativo. Que as portas não se fecham mas que ficam apenas encostadas. Que as janelas serei sempre eu a abrir. Que a luz existe até nos dias cinzentos. O tempo arruma os dias. As horas são uma ilusão porque na verdade são velocidade constante e feroz. Por isso: é não ter pressa. Começar apenas. E seguir.