sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

do calar-vos

não digam o meu nome. pronto, não digam o meu nome. abafem o som do meu nome. não gritem o meu nome. silenciem o meu nome. mordam o meu nome. que eu não quero mais existir por ele.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

do jardim

Falling Garden
San Staë church on the Canale Grande
50th Biennial of Venice, 2003
The Doge (Mocenigo) needed a church so as to be able to have a monumental tomb built for himself, the church (San Staë) needed a saint so as to be able to be built, the saint (San Eustachio) needed a miracle so as to be pronounced a saint, the miracle needed a stag in order to be seen, and we built the garden for the reindeer.The visitors lie on the bed above the doge’s gravestone, and the garden thinks for them.


segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

das batidas

tenho livros à cabeceira da cama que não consigo ler
tenho demasiadas palavras escritas em folhas que não são as que queria escrever

se o musgo aos meus pés me prende aos rochedos
de certeza de que não irão crescer os meus medos

se o meu coração entretanto parar
sei que é à terra que me devo agarrar

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Magnólia


Magnólia, upload feito originalmente por sossego.

flores como pássaros, não menos silenciosas.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

do comboio

estava dois bancos à distância do meu. as calças curtas, com os ténis calçados sem meias, a camisa muito molhada e esfarrapada, o cabelo curto, preto, e a flauta no banco ao lado. passaram cinco estações até ele tocar. a flauta desafinada, as notas inventadas por instinto, a boca da flauta ao contrário, a curva da flauta nas mãos dele. e as notas desafinadas a desafinarem-me o coração. a senhora da frente a abanar a cabeça, a criança que não se cala a comentar cada estação, a ler todas as letras, como só uma criança sabe fazer depois de aprender a ler. e as notas desafinadas a habitarem aquele comboio como silêncio. música fora do batimento cardíaco. como se não houvesse sangue por dentro. as notas daquela flauta, duras, secas, como aqueles sapatos sem meias, a desafinarem-me o coração.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

da beleza

uma rocha-vulcão
que me engoliu num véu de espuma
a violência com que a onda abraça
a rocha
e a violência com que a explosão me chegou
ao coração.
doeu.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

das janelas

as asas pesadas nas noites caladas
as janelas fechadas
a coruja que canta só quando o silêncio começa
e o som ecoa nas minhas janelas fechadas
o silêncio que se rompe
pelo eco das árvores paradas.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

all equal

all equal_lomo, upload feito originalmente por sossego.
as ruas cheias de ecos de pensamentos. as ruas cheias. os sacos de compras nas mãos. a chuva miudinha. era Londres, na Primavera. as ruas cheias. o globo do mundo nas ruas cheias.

School teacher (Miss Marley) at Narraburra School (1910)


quanto o tempo pára.
School teacher (Miss Marley) at Narraburra School - Narraburra, NSW, no date, by Eden Photo Studios | Flickr

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

da Pena


as asas verdes misturavam-se com o verde das folhas do carvalho. o nevoeiro estava espesso e o ar que lhe saía da boca misturava-se com a neblina do ar. impossível esconder o olhar de admiração perante aquele pássaro refilão e atrevido. sorri para ele, claro. as árvores conversavam umas com as outras através do vento. as nuvens estavam por cima de tudo, uma mancha negra e pesada com um ar ameaçador e que me lembrava algo como o fim do mundo. não passava eu de mais uma silhueta na colina. o casado preto comprido. as botas que me protegem dos pés até às canelas. os cabelos ruivos que parecem sempre provocar a luz. o gorro azul para tentar disfarçar tudo o resto. os raios começaram. um relâmpago depois do outro. e a chuva torrencial. ali, naquele monte, deixei o vento afagar-me o pescoço, deixei a chuva molhar-me as bochechas e deixei que os relâmpagos se colassem aos cabelos. o chão tremia debaixo dos meus pés. os pequenos seres da floresta, não duendes, mas rãs, fugiram. fiquei a olhar para uma e pensei: que graciosa. deixei de ver o verde. e o pássaro verde. o nevoeiro engoliu a paisagem e engoliu-me a mim. e a rã tirou-me a fala e depois percebi por que é aquele palácio mágico. se fosse de noite, de certeza que me tinha metamorfoseado. de preferência também eu numa rã. que graciosa, pensei.