quarta-feira, 16 de junho de 2010

Nas casas baixas vivem homens e mulheres, sozinhos e sozinhas, que acordam antes do dia. As mãos são mais pequenas, queimadas e rijas. A pele é muito rija e áspera e magoam quando tocam na cara. Por isso, escolhem não lavar a cara. A pele é muito espessa e rija. - Por que é que ela não tem um olho, mãe? - Foi o irmão, espetou-lhe um garfo no olho. Nunca mais brinquei com garfos, e durante dias só comi com a colher. As pedras foi o meu avô quem as lá pôs, no chão, são grandes e magoam quando as pernas fraquejam. Mas as pernas dobradas do meu avô sofreram mais que as minhas pernas quando fraquejam e caiem dobradas nas pedras. O meu coração também fraqueja, mas o coração do meu avô fraquejou mais, quando o dia chegou ao fim. Quando os meus pés sentem as pedras quentes e os meus cabelos se colam ao pescoço suado e as minhas mãos ficam rijas como a terra e como as alfaces rijas e cheiro as camisas que já ninguém veste, no armário mais antigo lá de casa e corro eira abaixo com medo dos uivos – eu sei, que aqui o coração importa.

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